5.12.11

a luz que vem quando a gente chama


claridade das claridades
ilumine o nosso caminho
nos guie de volta para casa
e nos torne invisíveis
aos olhos dos inimigos

.

11.11.11

1111


1 asa quebrada
1 coragem sentida
1 esperança acordada
1 vitória vencida


16.10.11

sweet/heart


esses tais amores de açúcar
não foram feitos para durar
porque morrem na primeira chuva
cravejados de formigas
no fundo da gaveta
de corações amargos
onde corre sangue salgado
sem ninguém para lembrar

11.10.11

au_revoir


au revoir aos salões de cortinas de veludo
onde o vinho tem o gosto do meu sangue
e nos lustres brilham os meus sonhos roubados
quero partir para as margens de ferro, suor e sal
onde o vermelho pode aquecer as minhas veias
trocarei o holofote pela luz do sol em brasa
e a sombra do gigante pela escuridão acesa
quebrei a prisão do ontem
e corro para o abismo do amanhã

2.10.11

viagem


indo voar nas asas do pássaro de ferro


29.9.11

amor.doc

... para a blogagem coletiva
"há amor em mim"

do blog da elaine gasparetto

{ um pouco de mim }
em comemoração de 3 anos!


Há amor em mim. Na verdade existem vários amores em mim. Mas vou falar de você, meu amor preferido.

Encontramos um ao outro no improvável e nos reconhecemos no encontro. As curvas do caminho que foi tecido apenas para nós, nos guiaram, lá de longe, na direção um do outro e, se você pensar bem, não tivemos escolha. O amor é incondicional. Ele usou artimanhas ardilosas na armadilha e quando demos por isso já estávamos de cabeça para baixo. E nunca mais voltamos para o chão.

Juntos sobrevivemos à um oceano de distância e à cem mil de despedidas. Você é quem me ama nos meus dias de tempestade, quando nem a casa fica de pé. Sempre andamos juntos quando o céu está menos azul. Quando me perco do meu Norte, você é o meu Sul. Aquela que me guia para casa. Minha companheira do Sempre. Que carrega em si a minha melhor parte. E eu carrego esse amor que há em mim. O meu amor preferido. O amor com cheiro de você.

24.9.11

salto


tememos tanto o abismo
sequer sabemos o amanhã
se não saltarmos com otimisto
toda esperança será vã

.

23.9.11

oh land | sun of a gun



...

you go down

down

down

i fall out of love with u

...

18.9.11

azul ava


sua mãe jurou por deus que o mar sustentava o céu. que as grandes nuvens de açúcar se dissolviam no horizonte. mas ava ainda acreditava no azul salgado. não se conteve. nadou até lá.

17.9.11

fim da monção




Pareceu-lhe que o Mundo iria acabar-se em água. Havia duas semanas que o céu lhes negava clemência. Aquela terra, antes tão seca e estéril, transformou-se em uma torrente furiosa de lama e água que inundou os sonhos daquele lugar esquecido por Deus. Da janela torta daquele barraco de madeira que ainda era a sua casa, ele observava o que havia restado do seu lugarejo. Entranhadas em lama, as ruínas de casas mais sólidas e importantes que a sua ficavam ali, caídas, caladas, moribundas. Ao longe, viu a água tremeluzente do rio escuro e a árvore equilibrada em suas raízes. Haviam sobrevivido. O rio havia voltado para as suas margens, mas tudo havia desaparecido.

E não se via vivalma.

Ele tinha quase a certeza que todas as vidas daquele lugar haviam sido lavadas com a enxurrada. Ali, em algum lugar, imersa em escombros e lama, uma multidão de almas procurava o caminho para o purgatório. Mais uma vez ele estava só, abandonado no silêncio tenso após a tempestade. Mas a sua casa pobre ainda estava em pé. Nem mesmo a chuva se lembrou de a levar.

Então, calado para não acordar a nuvem que dormitava distante no horizonte, ele velou os campos devassados pela tempestade. Nem restou pouco do pouco que tinha. Nada lhe ficou e ninguém lhe sobrou. Só lhe restava o direito de continuar e a graça a todos os outros negada. Revisitou então o encanto do nada e o valor do recomeço. Apenas isso lhe bastou. Não se prolongou na dor da perda.

Pegou o saco com os poucos pertences que tinha e agarrou com a mão calejada a enxada cansada de guerra. Em passo firme saiu pela porta velha e vermelha do seu barraco de madeira, que desmoronou logo atrás de si. O vento quente e úmido bafejou sua cara. A luz cor de cobre do sol moribundo pintava o céu já limpo de nuvens. Sua sombra parda se estendia para bem longe de si, apontando o caminho a seguir.

E apenas seguiu.

Só.

Em busca da próxima chuva.

22.7.11

liber/dade


pouco tempo para viver o que sonhamos
tempo de sobra para viver o que tememos
neste mar de correntes e bandeiras queimadas
a falsa liberdade é tudo que temos


26.6.11

divulgação | .tenente torrone!!


Hoje, enquanto a inspiração está no spa, queria divulgar um blog que acabou de sair do forno.

.tenente torrone!!

Um blog sobre comida, comida e, advinhem, comida! Dá pra sentir o cheiro de açúcar caramelizando daqui...

Enfim, quem adora comer, siga! Quem estiver de dieta, evite (ou finja evitar).

Fica a dica!

Abraço,

-aurelio


4.6.11

...


...

abraço
calorosamente
este tsunami
que vem
em minha direção

...




29.5.11

yu+zu | cidade


zu: belo serviço, seu idiota. quebrou a nave.
yu: gente... acho que é isso que chamam de cidade!
zu: isto é o inferno, isso sim. e estamos presos nele.
yu: quanta gente. que máximo!
zu: ja roubaram minha carteira!
yu: porque todo mundo tá com pressa?
zu: devem estar fugindo com minha carteira!
yu: menino, nosso planeta era mesmo um saco...
zu: estão olhando pra mim...
yu: eles parecem tão simpáticos...
zu: mas são terríveis. vamos embora.
yu: ei! porque as naves deles não voam?!
zu: que lugar imundo... quanta bactéria.
yu: vamos entrar naquela nave grande!
zu: nem pense.
yu: vai ser tão legal!
zu: nem pense.
yu: melhor! vamos descer ali! é o tal do metrô!
zu: parece... perigoso...
yu: então fique aí! fuuuuiiii!!!
zu: ei. espere! por onde é que se desce mesmo...?

coração


a noite anda sem mim, mas eu ando com ela
embriagado, inebriado, sem rumo, travado
trovando versos tortos que eu nem sei

perdido do meu norte, eu caminho para o sul
volto para o azul, do sol e da chuva de março
retorno para o abraço
e o calor que existe no espaço
entre o seu e o meu

27.5.11

imerso


sou um dia de chuva com cara de sol
o castelo de cartas soltas ao inverso
sou o último dominó que cai
sou o harlequim imerso

eu sei que estou descendo
mas insistem que estou subindo
aceito o destino de estar caindo
tudo me resta
o desejo de estar
agora
apenas
indo


22.5.11

selos!

Nas últimas semanas recebi três selos. Quero agradecer!!

Recebi estes dois

Photobucket

Photobucket

da Jeannine, dona do blog Pontas, Quinas & Beiradas

e recebi este

Photobucket

da Jacqueline, dona do blog Palavras do Poeta


Muito obrigado!

Agora, aquelas 10 coisas sobre mim:

1. escrever é meu balão de oxigênio
2. fico deprimido quando a criatividade some
3. adoro doces e toda sorte de gordices
4. signo capricórnio
5. prefiro o frio ao calor
6. minha cores favoritas são o branco e o preto
7. tenho claustrofobia
8. detesto puxasaquismoabsurdo
9. tenho temperamento instável
10. um dos meus apelidos é darth vader

E fiz meu próprio selo para dedicar àqueles que também andam por aí, sonhando pelos cantos do mundo cibernético...

Photobucket

E o selo do escritor de sonhos vai para...

Pontas, Quinas & Beiradas
Palavras do Poeta
Seasons of the Heart
Eu acho que eu simplesmente não sei
Jogando na parede
Fio de Ariadne
Palavra ao Vivo
Um pouco de mim
Que hay detrás?
...num todo meu coração esbraveja de alegria...
A Macho Alfa
Estação Harajuku

Grande abraço,

-aurelio

15.5.11

longe


me falta
aquele vento frio que esmurrava a minha face
me falta
a tarde de chuva gelada na água de inverno
me faltam
coisas emprestadas que passaram a fazer parte de mim
parte
de tudo aquilo que resta e do que sempre começa
me falta
tudo aquilo que deixei lá longe
e que preenche o que de novo nasce
aquilo me grita
me fala
me diz
que ainda não pertenço
à onde
estou
...



14.5.11

yu+zu | terra


zu - é à esta pedra mal frequentada que chamam Terra.
yu - mesmo?!
zu - é. mas não vamos descer lá.
yu - ah, mas eu quero ir ver!!
zu - já disse que não. é perigoso.
yu - deixa de ser frouxo!! 'bora lá!! desce a caranga!
zu - você sabe que não me misturo com selvagens.
yu - poooxaaa!! mas eu quero ver eles de perto!!
zu - ainda pegamos uma doença.
yu - ah, mas que doença que nada!
zu - ou nos matam.
yu- mas que... ei! peraê... você está com medo!!
zu - não estou não. apenas...
yu - então pousa esse treco ali, ó!
zu - ja disse que não.
yu - mas...
zu - crie juízo.
yu - aaaaaah!!! prontoaperteitádescendo!!
zu - deus me ajude.


13.5.11

mentira

apenas a verdade traz felicidade




11.5.11

röyksopp | what else is there?



it was me on that road
but you couldn't see me
too many lights out, but nowhere near here

it was me on that road
still you couldn't see me
and the flashlights and explosions

road's end getting nearer
we cover distance but not together
i am the storm, and I am the wonder
and the flashlights, nightmares, sudden explosions

i don't know what more to ask for
i was given just one wish

it's about you and the sun
a morning run
the story of my maker
what I have and what I ache for

i've got a golden ear
i cut and I spear
and what else is there?
road's end getting nearer
we cover distance still not together

if I am the storm, if I am the wonder
will I have flashlights, nightmares, sudden explosions?

i don't know what more to ask for
i was giving just one wish

road's end getting nearer
we cover distance but not together
i am the storm and I am the wonder
and the flashlights, nightmares, sudden explosions

there is no room where I can go and
you've got secrets too

i don't know what more to ask for
i was given just one wish

por röyksopp

10.5.11

à prova de bala


não existem acidentes

cair é uma arte
ferir-se, um ato de bravura
sangrar é apenas parte
e um erro, oportunidade

nos amanhãs que não tardam
levantar-se é uma guerra
equilibrar-se, pura malandragem
aprender é paciência

e sobreviver, necessidade


8.5.11

2082/renaissance


Este céu sobre mim é o mesmo com o qual vocês ainda sonham...

Ele não foi queimado, sequer tornou-se vermelho, nem está infestado de aeronaves luminosas. De fato, se pudesse dizer com alguma segurança, diria que, hoje, ele estaria tão puro e simples quanto em 1882. Tudo bem, aqui e ali vemos uma aeronave de branco brilhante cruzar o azul, silenciosa como um pássaro. Também vejo, cada vez menos, um ou outro sensor atmosférico flutuando sobre nós, monitorando o risco de impacto ambiental - praticamente inexistente - e multando uma ou outra cidade mais relapsa.

Sim, tomamos algum juízo.

Ainda me lembro quando, ainda jovem, vi certo filme de 1981, onde 2019 estava tão mais distante que o meu 2082. Sonhamos longe. Sempre. Naquele 2019 sonhado, o céu escuro de uma cidade de neon era rasgado por milhares de veículos voadores, pássaros de aço de um apocalipse iminente.

Já fomos pessimistas.

Vivemos nesta de década de dois mil e oitenta, um novo Renascimento; um embrião para a regeneração do planeta. A grande inconsciência das primeiras décadas transformou o céu em uma peneira de ozônio e derreteu grande parte dos glaciares. A China anunciou a tecnologia de regeneração da ozonosfera e, por sua vez, a ONU aprovou a clonagem massiva de várias espécies da fauna e flora, no ideal de recuperar o paraíso perdido. O genoma humano tornou-se uma carta aberta e a terapia genética um bote salva-vidas.

Mas não se enganem. Não melhoramos assim tanto.

Nesta neo-renaissance, observo, aos poucos, o dissolver da bioética na qual durante tantos anos acreditamos. Um simples acessar na neoweb, e, click, é possível comprar clones de espécies da fauna e flora extinta. A edição do próprio genoma virou uma moda entre a juventude, onde é mesmo possível simular um sem fim de possibilidades do Ser. Crianças que nascem programadas pelos desejos de seus pais, livres das sortes lançadas no processo de quiasma...

Mas o aspecto de toda essa maravilha que hoje tira-me o sono é a sombra densa e invisível que enxergo claramente no advento da clonagem humana e no seu universo infinito. Uma chave capaz de abrir os portões do céu e do inferno. Nos cantos mais escuros da neoweb circulam rumores de experiências que cospem na face de um Deus cada vez mais esquecido. Assustou-me especialmente um relato - ou boato - sobre um certo rapaz, de nome Max, penso eu. Talvez um nome fictício, ou fictícia personagem. Gostaria de acreditar nessa última possibilidade... Um clone dessa geração de entes mais ou menos queridos que subornam a dor de perdas e tragédias com tubos de ensaio e personificações de Deus. Max nasceu como uma simulação de felicidade, mas o mundo lembrou-lhe cedo demais que ele seria uma alma condenada a provações. Se o que li for verdade, então que Deus o ajude...



oh land | lean



did you really carry me when i was asleep?
did you try to defend me when i was weak?
did you pick up me up that lonely night when the lights died out and i turned to the grace?
did you carry me when i was asleep?

now you're out on the bottomless sea so its time for you to lean on me.
lean on me.
now you're out on the bottomless sea so its time for you to lean on me.

did you lie for me to keep me safe?
did you bear with me when i misbehaved?
far from here could you feel my fear when the lights died out and i turned to the grace?
did you lie for me to keep me safe?

now you're out on the bottomless sea so its time for you to lean on me.
lean on me.
now you're out on the bottomless sea so its time for you to lean on me.
lean on me.
ohh.

words are falling down.
frozen on the ground i'm trying to stop the light.

now you're out on the bottomless sea so its time for you to lean on me.
lean on me.
now you're out on the bottomless sea so its time for you to lean on me.
lean on me.
ohh.
lean on me.
lean on me.
lean on me.
lean on me.
ohh.

by nana Øland

2.5.11

arritmia

ele quis que fosse só sua
ela não
ela o amava
ele sem ela não viveria
ela não pensou
ele pensou que não
ela quis partir
ele partiu querendo
ele de coração rasgado
ela de coração livre

30.4.11

sem

sonha-se o que não se sabe viver
deseja-se o que não se pode ter
foge-se para onde não se pode ir
volta-se para certamente partir

sobre_viver

Protejamos com força forte os tesouros que carregamos junto ao coração.
Nosso abrigo, Sol, fôlego, alimento em dias de tempestade sem esperança.
Nosso espelho, escudo, farol, espada durante a guerra e a fúria sem nome.

Guardemos junto ao peito o que nos torna gente que sente e não gente que sofre.
A força, a graça, o dom, a bravura de atravessar o caminho escuro da incerteza.
O sopro, a mão, o grito, o passo na direção do medo vencido e da conquista tentada.

Protejamos com prodígio pródigo o que nos garante firmes neste chão que se desfaz.
O medo, a luta, a alma, a velha fé que sustenta com sábia paciência o ingênuo pranto.
A verdade, a sorte, a cara e a coragem de sobreviver ao inverno vazio do desencanto.

28.4.11

respostas


Se o Mundo acabasse amanhã, como o Hoje você viveria?

Se o Sol se apagasse para sempre, quem a sua Luz seria?

Se perdesse tudo na vida, o que mais lhe restaria?

Se fosse a última pessoa na Terra, por quem você choraria?

Se comprasse uma passagem para a Lua, quem você levaria?

Se três desejos eu lhe desse, qual deles você me daria?

Se o tempo girasse ao contrário, para quando voltaria?

Se nada fosse por acaso, em que destino apostaria?

Se tivesse três corações, quem você amaria?

Se houvessem nove mil caminhos, qual deles escolheria?

Se fosse matar ou morrer, qual seria?

Se por acaso não houvesse acaso, o que ainda importaria?

Se o Mundo acabasse agora, que última palavra diria...


...?

24.4.11

abel celeste

Abel...

Abel era um jovem mago, egoísta, vaidoso e de má raça, que morava sozinho no céu. Não porque o azul fosse a sua cor preferida, que invejasse as nuvens ou simplesmente quisesse estar acima da chuva... A verdade é que Abel, no alto de sua arrogância, achava-se tão magnífico como o Sol e belo como a Lua e, sendo assim, resolveu invadir-lhes a casa. Foi então que certo dia, sem escrúpulos ou humildade de pedir licença, fez de uma nuvem grande e espessa o seu castelo. Ao céu roubou um punhado de estrelas para iluminar as suas noites e lhe guiar o caminho quando resolvia viajar pelo firmamento noturno observando aquelas criaturinhas feias e grosseiras que moravam lá em baixo.

Assim, ao longo dos tempos, Abel vagueou pelo azul e pelas estrelas, observando silenciosamente os humanos que ele tanto ridicularizava pela ignorância. Confundido com cometas, deuses e naves extraterrestres, ele cruzava os céus sem pudores de ser visto. E olhava os Humanos com desprezo... Não era mais um deles. Subiu na vida, literalmente.

Morava no céu. O seu céu.

Lá em cima, o jovem mago guardava só para si os segredos preciosos daquele Mundo e de todos os outros que as estrelas fofoqueiras lhe sussuravam. Nem pensar em partilhá-los com os trogloditas lá de baixo. Nas suas viagens celestes sobre os continentes, Abel tirava prazer da miséria dos povos terrestres. Ria-se que se engasgava ao vê-los consumirem-se uns aos outros, divertia-se com a maneira estúpida como se envenenavam a si mesmos nas suas vaidades e ganâncias. Uma vez ou outra fez-se passar por um deus qualquer para semear a carnificina e o medo. O tempo passou e Abel então reparou que já nem era necessária a sua intervenção para inflamar o caos. Nem quisera acreditar em como o tempo os tornara tão estúpidos. Assistiu-os assassinar florestas, mares, rios, o seu prórpio ar, a sua própria gente. Bateu palmas ao vê-los dividir-se em religiões, tribos, países, partidos políticos... Abel até apostou com uma estrela cadente quanto tempo aquela praga de homo sapiens sapiens iria durar.

Não tardou para que seu desdém se transformasse em antipatia pessoal, quando certa vez quase foi atropelado por um foguete. Lá em cima, Abel amargou em sua raiva. Aqueles primatas estavam chegando perto demais! Quando aquela fumaça podre que fermentava lá com eles começou a chegar às suas portas, o mago eremita começou a observá-los com desconfiança e medo. Afinal, eles eram realmente capazes de ser perigosos. Até lá em cima.

Aquilo caiu-lhe como um insulto.

E então houve o segundo foguete. O terceiro, o quarto, o centésimo oitavo... Vieram os aviões, que se multiplicaram como um praga de gafanhotos. Em menos de nada, o território de Abel, antes tão azul, foi invadido por aquela gangrena suja e barulhenta que se espalhava lá em baixo.

Em ataques de fúria por já não conseguir dormir com o barulho de milhares de turbinas que cruzavam sua casa sem cessar, Abel lançava pragas e maldições que se manifestavam em um sem número de catástrofes e flagelos. Tufões, tempestades, raios e trovões, todos eles tinham a sua mão. Do sofrimento dos terrestres, o mago celeste tirava a sua doce revanche. Tornou-se implacável na sua rixa com seus vizinhos de baixo. Praga após praga, aquela rapsódia apocalíptica por ele criada saiu de seu controle.

Como se ele se importasse...

Nos dias em que estava especialmente azedo, Abel derrubava com um peteleco qualquer avião que lhe passasse, assim, mais perto... Mirava-os às cidades, mas estas estavam sempre cobertas pela névoa pastosa de sujeira, o que lhe arruinava a pontaria. Como se não lhe bastasse, começou a sabotar espaçonaves e enlouquecer o ciclo das estações. Cozinhava chuvas ácidas durante semanas, para as despejar sem pena.

Aos poucos, Abel, cego de fúria mesquinha, começou a enlouquecer.

E então que certo dia, enlouquecido de raiva com um foguete que lhe desfez a casa, Abel armou-se de tudo que tinha para o espatifar na terra ele mesmo. Ao correr que nem um relâmpago, quase alcançando sua vítima, Abel descuidou-se e caiu por um dos buracos na camada de ozônio.

Dizem que para baixo todos os santos ajudam, pois, sem dúvida, eles fizeram questão de ajudar. Abel despencou do céu como um Ícaro meteórico e nem suas mágicas lhe valeram, porque, assim como os santos, a gravidade também o detestava.

E caiu no mar da costa do Japão.

O corpo cadente de Abel alvejou as entranhas do mar como uma bala perdida. A terra tremeu, o céu mudou de cor e uma onda colossal levantou-se furiosa contra a costa. Foi o seu derradeiro e perverso ato de vingança.

. . .

2082/ contato

Hoje é o dia 1 de Janeiro de 2082.

Esqueçam o futuro apocalíptco ou as colônias em Marte. Pensem apenas em um mundo bastante diferente, várias décadas distante do vosso. Para alguém como eu, os anos já pouco importam nessa altura da vida. Olhando para trás, tudo parece tão longe. Sim, eu venho lá de longe; de 1982...

Antes que me perguntem, a resposta é óbvia... Não. O mundo não acabou em 2012, da mesma forma que não houve qualquer Apocalipse no virar do Milênio...

Mas houve um Apocalipse.

O mundo como o conhecíamos no início deste século, acabou. Tudo muda, eventualmente, e neste século de todas as transmutações, vimos tanta coisa nascer e morrer cedo de mais ou tarde de menos. A verdade é que este foi o século do efémero; da eternidade volúvel.

Lá de longe bem me lembro que, quando pisamos nos primeiros anos deste século XXI, houve todo aquele alarde sobre as catástrofes ambientais que devoravam o nosso planeta e tanto nos assustavam. As coisas não correram assim tão mal, mas houve perdas tristes. Contudo, aos poucos, o nosso próprio flagelo tornou-se demasiadamente perigoso e a Humanidade, por sensatez ou medo, ganhou algum juízo. Mesmo assim, nós pagamos um preço caro pela nossa ignorância.

É...

Ainda hoje o sentimos quando, muitos de nós que viemos lá de longe, somos tão dependentes da nossa dose de reposição genética, para não falar do oxigênio especialmente desenhado para aqueles que essas crianças de hoje chamam agora de genossauros... E eu que já me sentia um velho em 2050...

Pois é, para nós que não acompanhamos as - como direi isto de uma forma que me entendam - “edições” genéticas in vitro que essas crianças são sujeitas, sobreviver às alterações ambientais e biológicas deste fim de século é uma saga bastante cara. Nos tornamos “clientes fiéis” ou, a melhor dizer, dependentes do que os bio-fármacos e as clínicas genéticas têm a oferecer...

Mas não vim aqui para me queixar. Vivi muito e, pode-se dizer, bem.

Nesta série de relatos, quero apenas partilhar um pouco do meu hoje, vosso amanhã luminoso, o pós-Apocalipse brilhante, que da janela deste apartamento observo...